Levaram Melissa ao psiquiatra quando a menina jogou tinta
preta em todo o quarto, apenas para cobrir o rosa pálido e infantil das
paredes. Os ursos de pelúcia e bonecas ganharam lugar garantido nos brechós da
cidade e o dinheiro de suas vendas alimentou a compra de pínceis e quadros.
Livros e CD’s antigos. Melissa cresceu, antes mesmo de poder realmente crescer.
Por isso os olhares de Renato incomodavam. Não sentia
atração pelo menino, apesar de saber que era o rapaz mais bonito da cidade. Mas
aquele sorriso suave. Os olhos brilhantes, a gargalhada fácil...tudo isso era soava tão Paulo, que doía ficar mais de dez minutos com ele em qualquer lugar.
Quem realmente chamava sua atenção era Miguel. Rosto de
anjo, postura de guerreiro. Não guerreiro de filmes épicos, mas alguém que não temia a vida. Alguém que com tão pouca idade sabe o significado do que é sofrer. Olhar duro e sorriso inflexível. Por debaixo disso
tudo um poeta. Nas vezes que ficara de castigo ao final das aulas, Melissa estivera na mesma sala
que ele e descobriu o quanto sua presença a acalmava. Eles quase não
conversaram, mas o pouco que falaram descobriram muita coisa em comum e outras
nem tanto.
Melissa sentia um desejo absurdo de estar com ele, mas tinha
medo. Tinha medo de que ele descobrisse o que ela fazia para fazer a dor parar.
Mas uma vez tocou involuntariamente o pulso direito. E uma mão forte e firme segurou em seu pulso
também.
Assustada a menina observou a mão e só depois levantou a
cabeça e ali estava ele. Miguel a olhava de forma firme, como sempre fazia, mas
havia uma sorriso brincalhão ali. Melissa, involuntariamente sorriu, de nervosismo, mas sorriu.
Com ele era dessa forma. O riso vinha fácil, não havia medo. Não havia tristeza e Melissa se sentia culpada por não estar triste na presença de Miguel. Mas o rapaz tinha algo mais. Fruto de frequentes mudanças de escola por mau comportamento, brigas e desentendimentos, Miguel era uma força que, quando andava pelos corredores, fazia com que o mar de pessoas se abrisse para que ele pudesse passar.
Semblante sombrio, palavras duras e mesmo assim Melissa se sentia calma ao lado dele. Miguel sorriu ao ver as marcas. 'Parece que alguém aqui anda escondendo o que sente', afagou uma linha fina e olhou diretamente para olhos claros da menina. Melissa sustentou o olhar, mas não por muito tempo. Sabia que Miguel nem sempre fora duro e sarcástico. Um dia aquele jovem fora tão doce e simpático quanto ela um dia foi.
Continua...
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Por Kamila Mendes
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