Quanto
vale as horas de sorrisos e lágrimas juntos? E os dias passados entre
brincadeiras e discussões tolas? Foi o que Fabrício se perguntou aquela manhã,
sentado com uma revista na mão à espera de uma resposta que mudaria sua vida.
Na noite
anterior, ele e Bruno tinham tido uma briga ridícula sobre uma garota que ambos
estavam afim: Bruno queria algo sério, sentia que poderia ter um relacionamento
forte e Fabrício, bom, Fabrício era o pegador do bairro, garotas eram apenas
deliciosos troféus. Eles haviam discutido porque disputavam a mesma menina.
Nenhum dos dois sabia o que aconteceria naquela madrugada.
As 3h da
manhã o celular de Fabrício tocou. Injuriado por ser acordado e ainda mais
chateado por ver de quem era a chamada, simplesmente ignorou a ligação de
Bruno. Mas três chamadas insistentes e Fabrício atendeu com a costumeira
grosseria arrogante: O que foi, cara! Pow meu, quero dormir, tu já viu que
horas são?!
Do outro
lado, um soluço e uma frase: Estou morrendo cara, vem aqui, não consigo
levantar. O mundo tah girando e tow sangrando por tudo quanto é canto. Me
ajuda, man. Tu sabe que não ia te ligar se não tivesse precisando.
Chateado,
achando que era alguma armação de Bruno, Fabrício demorou a sair de casa.
Resmungando, se vestiu e dirigiu o mais devagar que pode. Quando chegou ao
prédio do amigo, estranhou que seu apartamento fosse o único com as luzes
acessas, afinal, Bruno dormia cedo e reclamava de qualquer claridade no quarto.
Subiu pelo
elevador. O décimo andar estava morbidamente silencioso e um frio percorreu a
coluna de Fabrício. O apartamento 310 estava numa calmaria espantosa. A porta
estava entreaberta e Fabrício entrou sem bater. O que viu marcaria sua vida
para sempre: sangue, sangue em todo lugar. Móveis, cozinha, chão, indo em
direção ao banheiro. Lá dentro, um Bruno pálido com sangue saindo pelo nariz e
sabe-se lá por onde mais.
- Man, o
que foi isso? Pirou, foi? Nem sabia que tu era chegado em pó?
Sorrindo,
apesar da dor, Bruno disse: e não sou, cara. Aconteceu do nada, tava
jantando e meu nariz começou a sangrar. Cuspi sangue na pia e corri pro
banheiro. Nada estanca essa porcaria. Tudo dói, bicho. Me ajuda!
Apesar de
tudo, ele sorria. Fabrício carregou o amigo até o carro e, mesmo sabendo que
era perigoso, preferiu não chamar a ambulância. Sabia que chegaria mais rápido
ao hospital.
Agora,
sentado naquela sala asséptica, branca, com um vaso de flor, apenas pra deixar
o ambiente mais melancólico, pensava: discutir por causa de uma mina,
realmente valia a pena? Bicho, ele é meu amigo de infância e por causa de mim
ele poderia ter morrido sangrando. Cara, uma mina num vale isso!
Continha
as lágrimas de medo, quando a enfermeira anunciou que o amigo o chamava. Ao
entrar no quarto do hospital, viu a cena que nunca queria ter visto. Bruno
estava ligado a aparelhos. Uma bolsa de sangue pingava lentamente o líquido
vermelho que garantia o pulsar esforçoso de seu coração. Máquinas apitavam
medindo os sinais vitais do rapaz, e, apesar disso, ele sorria.
Fabrício
ficou estático, besta ao olhar a cena.
Bruno ria: Eu sabia que tu ia ficar assim, por isso não disse nada. Mas,
cara, como esse troço é rápido. Man, se tu quiser, pode ficar com Melina, eu
vou morrer mesmo. Tenho leucemia, bicho, mas vamos fingir que foi só uma overdose...rsrsrs
Fabrício
continuou em choque. Andou até a cama e abraçou Bruno, um abraço desajeitado, e
perguntou o que poderia fazer. Conversou com os médicos e começou uma campanha
de doação de sangue. Não só para Bruno, mas por todos que precisassem. Quanto
vale uma amizade? Brigas bestas quase me fizeram perder meu irmão. Sim, ele é
meu irmão!
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Kamila Mendes
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