domingo, 22 de abril de 2012

Momentos de nostalgia


- Marcos, o que você está fazendo?

- Nada, mãe, nada!

Com essa resposta, Marcos voltou sua atenção para a tela do computador. Sem perceber limpou uma lágrima cristalina. Essa foi apenas a primeira. Tantas outras desceram, enquanto rolava a barra de seu e-mail.

Nas pequenas gotas salgadas vinham descritos tantos momentos, tantas emoções. Uma pareceu doer ao escorrer pelo seu rosto. Carinhosamente, Marcos limpou essa gota de emoção. Deixou com que ela se aconchegasse na ponta de seu dedo e a admirou. Admirou tantas alegrias e tristezas reunidas em um único momento. Viu como ela assumia as formas de seu dedos e se moldava aquele momento.

Sentiu falta dela. O coração apertou, a garganta se fechou. Mordeu os lábios e chorou baixinho. Como tantas outras vezes fizeram. Mudou de página, ainda não estava preparado para relembrar cada momento, cada segundo apenas com a saudade de quem sabe que o tempo já curou a ferida. Ainda era cedo, ainda queimava, ainda doía.


Então vasculhou suas antigas páginas de redes sociais. Ali encontrou tantos momentos. Tantas experiências, que, meu Deus, como não acreditar que eram reais?

Sorriu ao lembrar de conversas toscas sobre God of War, ou RPG. Tantas vezes que consolou amigas virtuais, com lágrimas virtuais, que terminaram namoros virtuais! Isso era engraçado. Como pessoas tão distantes podem acrescentar tanto na vida? Marcos riu!

Riu uma risada gostosa. ‘Tanta coisa aconteceu, mas foi ali, pela internet e mesmo assim foi tão real! Tantas alegrias, tantas dores, lágrimas, risos, gargalhadas... E a vontade de conhecer e dar uma abraço em todos... Nossa isso não tem descrição, é único!’, pensou nosso amigo sonhador.

Um barulho do lado de fora da janela chamou sua atenção, meninos brincando de jogar bola, com pés descalços, traves toscas feitas de barras de ferros encontradas em um terreno baldio qualquer. Aqueles garotos eram diferentes do garoto que um dia ele fora. Pés descalços, camisas sujas. Suados e sorrindo e gargalhando. Marcos fora um garoto calmo, viciado em vídeo game, romântico e apaixonado por livros. Nunca jogou futebol na rua! Nunca teve os cabelos molhados de suor.

Percebeu que não vai contar esse tipo de histórias para seus filhos, se os tiver! Percebeu que aquelas aventuras de subir em arvore, espiar a vizinha pela janela nunca lhe ocorreram. Seus filhos vão crescer com histórias a lá Sherlock Holmes, jogando vídeo game e praticando esportes em academias.

Mas ele não sentia falta daquilo. Seu mundo não era mais cinza só porque nunca jogara bola na rua. Ele podia não jogar bola, mas sabia comandos e programações que os moleques lá embaixo nunca sonharam. ‘É meus filhos vão saber o que sei, mas também vão jogar bola, vão jogar vôlei na praia e sair por aí pra vadiar um pouco. Isso é sempre bom. Vão saber escolher um notebook pela configuração e não pela estética. Vão ser fãs de Agatha Christie e ler os livros de Percy Jackson com a mesma voracidade que vão comer um churrasquinho de gato na esquina da escola. Vão ter o melhor dos dois mundos. O que vão fazer com isso é escolha deles’

Um plim na tela do PC chamou sua atenção mais uma vez!  E sua jornada pelas lembranças recomeçou. Mas já não haviam lágrimas. Só uma nostalgia profunda, misturada com aquele sentimento gostoso do medo do futuro.  E suas expectativas renovadas. E o plim o chamou de novo. O nó na garganta voltou, o aperto no coração, mas não fugiu, não fechou a janela. Respirou fundo e recomeçou!

1 comentários:

Elton SDL disse...

'Vão ter o melhor dos dois mundos. O que vão fazer com isso é escolha deles’
Esse trecho, parece-me, a Kamila tirou exatamente de um ponto central de meu pensamento e visão de mundo - pois é desse mesmo modo que enxergo o futuro para meus herdeiros e todos aqueles que depreendam algo com minha pessoa.
Parabéns pelo texto, Mila! Sempre esbanjando sensibilidade, num escrita intimista. Dissecando com minúcia aquilo que diz respeito ao ser humano. Fico feliz por nossa conversa sobre a realidade da realidade virtual ter te inspirado a escrever esse post. Aliás, é isso que os grandes artistas fazem: extraem da casualidade e da pequenez, o sumo para grandes composições.