- Marcos, o que você está fazendo?
- Nada, mãe, nada!
Com essa resposta, Marcos voltou sua atenção para a tela do
computador. Sem perceber limpou uma lágrima cristalina. Essa foi apenas a
primeira. Tantas outras desceram, enquanto rolava a barra de seu e-mail.
Nas pequenas gotas salgadas vinham descritos tantos
momentos, tantas emoções. Uma pareceu doer ao escorrer pelo seu rosto. Carinhosamente,
Marcos limpou essa gota de emoção. Deixou com que ela se aconchegasse na ponta
de seu dedo e a admirou. Admirou tantas alegrias e tristezas reunidas em um
único momento. Viu como ela assumia as formas de seu dedos e se moldava aquele
momento.
Sentiu falta dela. O coração apertou, a garganta se fechou. Mordeu
os lábios e chorou baixinho. Como tantas outras vezes fizeram. Mudou de página,
ainda não estava preparado para relembrar cada momento, cada segundo apenas com
a saudade de quem sabe que o tempo já curou a ferida. Ainda era cedo, ainda
queimava, ainda doía.
Então vasculhou suas antigas páginas de redes sociais. Ali encontrou
tantos momentos. Tantas experiências, que, meu Deus, como não acreditar que eram
reais?
Sorriu ao lembrar de conversas toscas sobre God of War, ou
RPG. Tantas vezes que consolou amigas virtuais, com lágrimas virtuais, que
terminaram namoros virtuais! Isso era engraçado. Como pessoas tão distantes
podem acrescentar tanto na vida? Marcos riu!
Riu uma risada gostosa. ‘Tanta coisa aconteceu, mas foi ali,
pela internet e mesmo assim foi tão real! Tantas alegrias, tantas dores,
lágrimas, risos, gargalhadas... E a vontade de conhecer e dar uma abraço em todos...
Nossa isso não tem descrição, é único!’, pensou nosso amigo sonhador.
Um barulho do lado de fora da janela chamou sua atenção,
meninos brincando de jogar bola, com pés descalços, traves toscas feitas de
barras de ferros encontradas em um terreno baldio qualquer. Aqueles garotos
eram diferentes do garoto que um dia ele fora. Pés descalços, camisas sujas. Suados
e sorrindo e gargalhando. Marcos fora um garoto calmo, viciado em vídeo game,
romântico e apaixonado por livros. Nunca jogou futebol na rua! Nunca teve os
cabelos molhados de suor.
Percebeu que não vai contar esse tipo de histórias para seus
filhos, se os tiver! Percebeu que aquelas aventuras de subir em arvore, espiar
a vizinha pela janela nunca lhe ocorreram. Seus filhos vão crescer com
histórias a lá Sherlock Holmes, jogando vídeo game e praticando esportes em
academias.
Mas ele não sentia falta daquilo. Seu mundo não era mais
cinza só porque nunca jogara bola na rua. Ele podia não jogar bola, mas sabia
comandos e programações que os moleques lá embaixo nunca sonharam. ‘É meus
filhos vão saber o que sei, mas também vão jogar bola, vão jogar vôlei na praia
e sair por aí pra vadiar um pouco. Isso é sempre bom. Vão saber escolher um
notebook pela configuração e não pela estética. Vão ser fãs de Agatha Christie
e ler os livros de Percy Jackson com a mesma voracidade que vão comer um
churrasquinho de gato na esquina da escola. Vão ter o melhor dos dois mundos. O
que vão fazer com isso é escolha deles’
Um plim na tela do PC chamou sua atenção mais uma vez! E sua jornada pelas lembranças recomeçou. Mas já
não haviam lágrimas. Só uma nostalgia profunda, misturada com aquele sentimento
gostoso do medo do futuro. E suas
expectativas renovadas. E o plim o chamou de novo. O nó na garganta voltou, o
aperto no coração, mas não fugiu, não fechou a janela. Respirou fundo e
recomeçou!
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