Sentada,
no ônibus lotado, com o joelho latejando e suando em bicas, me deparo com uma
cena inusitada para uma terra de machões, desprovidos de sentimentos, em que
qualquer ato de gentileza, ou expressão de emoção, é tido como motivo de
chacota: um homem do tipo machão ogro, (daqueles de quem não se espera nada,
além de atos como cuspir na rua e coçar as partes intimas em público) em pé no
ônibus, segurando apenas com uma mão e com a outra segurando um livro.
Mas
o fato inusitado não era o machão com um livro na mão, mas os olhos do dito
cujo. Seus olhos estavam marejados. Ele não apenas segurava o livro, mas o lia,
em pé, com o ônibus em movimento.
Ele
usava uma blusa preta, aquelas de banda de metal, que os caras usam pra mostrar
que curtem rock e são ‘macho pra caramba’, corrente prata no pescoço, boné e
óculos escuro apoiado na aba do boné. Toda uma postura de mal encarado e pronto
pra ‘descer o braço’ no primeiro que olhasse feio, mas em suas mãos estava “A
culpa é das estrelas”, de John Green.
Não
foi o cara que me chamou a atenção. Cansada e sentindo dor, meus olhos vagavam
pelo ônibus procurando algo pra me distrair, então, vi aquela capa azul com
nuvens preta e branca. Sabe aquele ditado que rola entre os leitores de que um
livro indica um leitor? Foi o que pensei na hora. Subi o olhar e vi o cara.
Abri
um sorrisão. Porque na hora ele desviava o olhar do livro. Olhos cheios d’água,
rosto vermelho. Ele desviava o olhar como alguém que não quer chorar em
público. Respirava fundo, voltava a ler e olhava pela janela. Passou um tempo
olhando pela janela. Depois voltou a ler. Acho que, controlada as emoções, teve
certeza que não choraria em público e pode voltar a ler.
Foi
uma cena que me fez rir e me surpreendeu. Fez valer a máxima: “Os brutos também
amam”.
Kamila Mendes
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