E então veio o gelo, granizo. Bolotas de gelo sobre uma terra que nunca viu neve. O espanto, medo e horror. Ruas alagadas, casas inundadas, pessoas ilhadas.
O negro céu mostrando raiva e vingança por anos e anos de abuso humano. O gelo despedaçando telhados, outdors, caindo violentamente contra vidro, zinco e barro, derretendo tão logo toca o solo.
Horas negras, em que a natureza se vinga. Arvores arrancadas pela raiz, jogadas em carros, casas, atravessadas no meio da rua. Postes eletricos no chão. Semaforos apagados. Escuridão.
Horas de silêncio após o bravio rugido de pura vingança da natureza. Um dia pra marcar a vida de muitos. Um dia na escuridão do céu revolto, das casas sem luz, sem internet, sem telefone.
Voltaram ao tempo em que precisavam apenas da luz do Astro Rei e das velas. Ilhados no desespero causado por suas ações desmedidas e insensatas. Presos nas consequências de sua voracidade por consumir sempre mais e mais e mais.
A calmaria na escuridão era pior. Teorias do que acontecera ao resto da cidade. Nenhum telefonema, nenhum e-mail. Apenas o silêncio e a espera. Horas a fio, sentados na frente de casa observando o tempo ameaçadoramente se mexendo. Nuvens carregadas anunciando um novo temporal tão violento e devastado como o de outrora. Nenhum som, a não ser de vozes nervosas conversando futilidades, tentando romper o silêncio do temporal.
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Kamila Mendes
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