Ela abriu os olhos, mas ainda não era manhã. Continuou deitada,
apenas observando o teto. Seus olhos elétricos vislumbravam a escuridão. Nada via,
mas isso pouco importava! Queria apenas a calmaria que vinha assim que os
longos dedos do sono alcançavam seu inconsciente. Em sonhos, voava como uma
borboleta. Sentia-se livre, sem as grossas amarras da decepção que voltavam a
laçar seu frágil coração no mero e simples abrir de olhos.
Passou a mão pelo lado esquerdo do colchão e nada tocou. Aqueles
olhos azuis se fecharam contendo as lágrimas que ela não queria deixar rolar. Pensou,
mordendo os lábios, ‘até quando?’, murmurou. Mas a resposta não veio. Ela nunca
vinha!
Continuou deitada, quieta. Mantendo todos os pedaços de seu
ser atados pela simples razão de não querer desabar. Já não suportava mais
aquela ausência. De fato, há muito não sabia o que era presença! Queria apenas
mais um amanhecer sem dor e lágrimas.
Os primeiros raios de sol entraram pela janela. Era inútil
permanecer deitada. Com esforço sobrehumano, levantou-se! Andou na ponta dos
pés pela casa. O chão gelado do dia recém-acordado não lhe era agradável. Lembrou
de quantas vezes os braços amados envolveram sua cintura e em uma gargalhada
rouca de puro divertimento a levantaram do chão pra que o gelo já não lhe
causasse arrepios. Sorriu e uma lágrima rolou!
Desejou profundamente que os dedos do amor viessem para
enxugar essa pequena fugitiva. Mas eles não vieram. Nunca mais viriam!
Ligou o chuveiro. Uma ducha quente era do que precisava. Deixou
a água descer até o âmago de sua alma. Sentiu, não a amargura, não a dor, mas o
vazio descer pelo ralo. Observou a água por entre os dedos. Apenas admirou a
poesia contida ali.
Vestida para sair, abriu a porta. Uma brisa morna entrou e
subitamente roubou um sorriso seu. Há quanto tempo não sorria de forma tão
espontânea? Ela não sabia. Mas sorriu. E isso já era o suficiente para ela.
by - Kamila Mendes
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